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Existem muitos tipos de títulos da dívida pública, a grande maioria tem valor no mercado e oscila de acordo com as perspectivas econômicas do país e sua conversibilidade em outros tipos de moeda.
As antigas apólices da dívida pública, entretanto, deixam os armários dos colecionadores para compor uma tentativa, até agora frustrada, de dar um golpe nos cofres da União em valores que ascendem a cifra dos trinta bilhões de dólares.
Estes papéis começaram a ser emitidos em 1902, ainda pelo presidente Campos Salles, ainda na época do "conto de réis" e, conforme informou a Procuradoria da Fazenda Nacional, já se encontram prescritos há mais de três décadas.
Na verdade estes títulos foram emitidos desde o ano de 1902 até o ano de 1940, por sucessivos governos, com a finalidade de captar recursos para a construção de pontes e ferrovias, depois, já a partir de 1956, o governo começou a resgatá-los. Entretanto, 2% (dois por cento) dos títulos, que correspondem a aproximadamente 200 (duzentas mil) apólices não foram resgatados à época.
No ano de 1967 o governo anunciou que resgataria esta sobra, mas não o fez. Depois, considerando que a União Soviética firmou um acordo com o Governo Inglês, comprometendo-se a honrar títulos da época dos czares russos, alguns especuladores resolveram fazer as contas de correção e juros que poderiam incidir sobre estes títulos e começaram a apostar algumas fichas na possibilidade de utilizar estas apólices como moeda de privatização.
Com tamanha possibilidade de lucros foram contratados advogados de renome e auditores do mesmo quilate para oferecerem pareceres que concluíssem pela validade dos títulos e para apurar o seus valores atuais, considerando a data de sua emissão e o valor dos juros estabelecidos à época.
Nesta empreitada envolveram-se financistas, empresários e especuladores nacionais e internacionais, todos movimentando pelos canais do poder de forma a influenciar membros do executivo, do legislativo e do judiciário para viabilizar a transformação dos papéis podres em dinheiro limpo e legal.
Como fruto deste trabalho, ou porque são direta ou indiretamente interessados, alguns membros do poder legislativo, já começaram a movimentar com o objetivo de aprovar leis que obriguem o governo a aceitar estes títulos em compensações de créditos e como moeda de privatização.
Alguns juizes também já entenderam que os títulos não estão prescritos, por conseqüência seriam válidos e devidos, competindo à União Federal resgatá-los ou aceitá-los como moeda para compensação de dívidas.
Estas notícias, óbvio, aceleraram a cobiça de milhares de espertalhões ávidos pelos negócios de lucro fácil e bastaram apenas alguns negócios de maior vulto e os títulos voltaram ao mercado informal com cotações que variam entre 3% e 5% sobre o valor atualizado destes papéis.
Algumas empresas que têm débitos para com a Fazenda Pública já estão utilizando estas apólices para ganhar tempo nas execuções a que respondem, oferecendo-as em penhora, para deixar livres seus outros bens, enquanto discutem suas dívidas. Como a justiça é lenta, as vezes compensa comprar estas apólices, oferecê-las em garantia das dívidas durante longos anos, até ver como fica.
Na verdade, é um golpe e tanto.
O pior é que há a possibilidade, ainda que remota, de que estes títulos, embora declaradamente prescritos, possam, por força de legislação ou por decisão judicial, serem finalmente resgatados pelos cofres públicos, na modalidade de moeda de privatização, moeda para pagamento de impostos, ou mesmo como moeda de compensação de dívidas.
Neste caso, claro, mais uma vez ganharão os especuladores, brasileiros e estrangeiros, os sonegadores de impostos e os devedores contumazes, enquanto, na mesma proporção, claro, perderá o nosso cidadão contribuinte.
* Danilo Santana é advogado militante e presidente da ABC - Associação Brasileira de Consumidores .